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LET

Há uma pergunta tão difícil de responder quanto aquela que procura saber “quem nasceu primeiro”, se o ovo se a galinha, e essa prende-se com a música electrónica uruguaia e Nicolas Lutz. Se a música eletrónica escura, ácida, “spooky”, nasceu antes do Lutz, certamente, mas o Lutz não foi apenas o mensageiro que a levou mundo fora; ele foi sem dúvida o arquitecto, o DJ que ao longo de vários criou um estilo muito próprio, colecionando discos oriundos do techno, do acid, de certas latitudes obscuras do house e do electro, para criar aquilo que foi a matriz desta música que automaticamente reconhecemos como a música electrónica do Uruguai. Produtores tais como Z@P, Mitchelle ou Tunik (com a excepção deste último que é argentino) editaram na My Own Jupiter (a editora do próprio Lutz) e o Lutz pode não só ser o mentor desta nova geração de artistas, como reunir e editar a música que correspondia aos diferentes elementos que procurava na música electrónica. Mas o fenómeno que durante anos viveu restrito às fronteiras do Uruguai, com algumas pontuais contaminações por outros países da América Latina, tais como a Argentina ou o Paraguai, tomou, desde o ano passado (2023), conta do mundo da música underground. São raros os DJs que pela sua idiossincrasia musical conseguem tomar conta da paisagem sonora global, mas tal como Lutz, existem outros exemplos, como é o caso de DVS1 que marcou um ponto de viragem na história do techno (até então, essencialmente dominado por produtores/DJs negros, tais como Jeff Mills ou Robert Hood), Ricardo Villalobos que não só criou o minimal, como modelou e influenciou uma das maiores e mais recentes correntes de música electrónica (minimal romeno) ou ainda Francesco del Garda, figura determinante não só na entrada do house para o circuito underground, como é o próprio house que hoje ouvimos/produzido na cena underground é “delgardiana”. E apesar de longo o enquadramento, penso que não poderíamos falar da nossa próxima DJ convidada, a paraguaia Leti González, sem esta mesma introdução. A Let é sem dúvida uma das mensageiras desses ritmos escuros, trippy e spooky do Uruguai que tomaram de assalto o mundo da música electrónica underground. Se ouvirmos o set dela na Alínea A, gravado em Junho deste ano e disponível no Youtube, percebemos a clara influência dessa música ao longo do set e no entanto, ela coloca um cunho muito pessoal, ao procurar simultaneamente quebrar essa tónica escura, combinando com breaks e ritmos mais espaciais e sintéticos. Ritmos esses que ela traz já do seu passado electrónico e que rapidamente reconhecemos ao longo do set gravado para Concentric Movement e disponível no soundcloud. É por isso um prazer, receber pela primeira vez na cabine do Harbour a Let, DJ que sem dúvida tem marcado a noite do Porto, onde actualmente reside.