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Brusca

A Brusca faz parte de uma dupla nova geração. Quero com isto dizer que além de fazer parte de uma nova geração de techno em Portugal, faz ainda parte de um movimento feminino (mais ou menos inorgânico) de djing. Foram vários os factores que contribuíram para a formação de ambos os movimentos, mas penso que o surgimento de diversas mulheres DJs no recente panorama nacional prende-se sobretudo com questões sociais e políticas, ou seja, determinados espaços dominados por homens e socialmente “interditos” a mulheres (como é o caso da noite), perderam não só a sua força hegemónica masculina (com a ascensão de diversas DJs mulheres ao Olimpo dos DJs superstar, como é o caso de Nina Kraviz, Helena Hauff, Ellen Allien, Honey Dijon, Peggy Gou… e que influenciou de forma determinante as novas gerações mundiais, que pela primeira vez na história da música electrónica, viram diversas mulheres a tomarem conta das cabines e a moverem legiões de fãs), como certos tabus e interdições perderam as amarras morais e sociais (a “noite” é um espaço visivelmente mais democrático, onde as mulheres que saem são cada vez menos estigmatizadas por fazê-lo). Mas se a popularização das mulheres no djing é de ordem mais ou menos mundial, já a questão do techno em Portugal deve-se a factores mais concretos e concertados. Se é certo que o techno ganhou um novo folgo a nível mundial, depois de alguns anos relativamente tépidos em que o techno berlinense perdeu o seu fulgurante ímpeto (altura em que nomes tais como Ben Klock, Marcel Dettman ou DVS1 tomavam conta das maiores e mais importantes cabines mundiais), dando espaço ao minimal romeno e à cena tech house; em Portugal, o techno ganhou uma nova tracção sobretudo (e graças) ao colectivo Hayes (composto pelos maiores nomes da cena techno portuguesa), às celebres noites do Dexter no Lux (que deixaram uma marca indelével no panorama nacional, mesmo numa época de “declínio” do género) e ao trabalho persistente e regular do Gare, bastião nacional do techno português e internacional, que tem aberto e sedimentado dezenas de carreiras de DJs. Além de que esta nova geração é uma geração em rede, contacta-se, procura-se, estabelece parcerias, troca ideias, está aqui, mas ciente do além e isto permitiu a que novos DJs e produtores de techno portugueses podem-se partilhar as suas criações, as suas pesquisas, as suas fórmulas e formar uma comunidade. Dessa comunidade, Brusca é uma peça essencial, assim como é Salbany, Jesterr, Catarina Silva ou Laura, que têm tomado conta das mais diversas e importantes cabines de Portugal, difundido um techno muito particular e idiossincrático. E aquilo que torna a nossa convidada desta semana tão especial é sem dúvida o techno seco, minimal e escuro como que inicialmente nos envolve e que rapidamente nos conduz a certos momentos de explosão celebrativa, pontuado pela voz ou acordes luminosos (exemplo disso, é sem dúvida o set disponível no Youtube, promovido pelo festival Basilar em 2022), uma verdadeira união entre o techno moderno e o techno de Detroit, tão cuidadosamente misturado e balançado. E claro, não poderia concluir este texto, sem deixar de assinalar, que esta comunidade só é possível graças a todos os agentes que nos últimos anos, quer através de festivais (como é o caso do Basilar), quer através de festas (como é o caso do ¼ Escuro ou da Vértice), quer dos próprios clubes portugueses, que permitem ao techno português que continue a florescer e a dar palco a novos artistas.